sábado, 27 de fevereiro de 2010

Conversa de Bar

Após entregar uma matéria encomendada pela revista Cultura Paulistana, sobre as caixas de som, espalhadas pelo Centro de São Paulo, tocando música erudita, e sua influência no cotidiano dos paulistanos, paro no tradicional Bar Brahma, para tomar aquele delicioso chopp. Fui só, como uma comemoração pessoal, mais pra relaxar. Gostei muito daquilo que escrevi e partes do texto voltavam a minha mente, em “looping”. Teci um panorama, tipo Louis Armstrong, cantando “What a Wonderfull World”, com cenas da guerra do Vietnam. A pressa diária e os abandonados do centro de São Paulo, embalados pela Primavera de Vivaldi. A dialética de um universo em desequilíbrio, a Sinfonia da Miséria. Senti, que apesar dos anos passados, continuava tendo “tesão” pelo meu trabalho, não me conformava com o olhar acomodado da mídia, e isso, para mim, era motivo de grande satisfação. Muitas vezes, a satisfação pessoal, é o melhor prêmio que podemos nos conceder.
Um casal de trinta e poucos anos, da mesa ao lado, levemente alcoolizados, ele mais que ela, falava alto. No começo me incomodei, queria sossego, mas acabo não conseguindo deixar de ouvir a conversa deles:
- Ah!!! O que você acha que chama mais atenção em você??? Pergunta ele, achando óbvia a resposta.
- A inteligência, o cérebro, é claro!!! Responde ela com firmeza.
“Hum, que papo de bêbado...”, pensei.
E o papo continuava:
- Você tá louca!!! Olha o tamanho do seu cérebro e olha o tamanho da sua bunda!!! Deus fez assim!!! Deus quis assim!!! Pra quando a mulher passar, os homens desejarem aquela bunda. Desejarem copular com a dona daquela bunda. É assim na natureza!!!
- Na natureza, entre os irracionais!!! Fala, já mostrando certo constrangimento, pela atenção pública gerada.
- O que seria muito mais fácil, né??? Não precisava vir pro bar, gastar dinheiro, beber muita cerveja, jogar conversa fora e só trepar depois, já sem controle total do que a gente está fazendo... Assim prejudica o padrão de qualidade!!! Hahahahaha!!! Só ele ri, achando graça de sua própria piada.
- Seu ridículo!!! Até parece que eu vou pra cama com você. Não vou com ninguém no primeiro encontro, muito menos com alguém como você!!! Seu podre!!! Responde asperamente, já irritada.
- Eu podre??? Sexo... desejo, é o instinto mais primitivo. Se fosse o cérebro o que importasse, vocês, mulheres andariam com o diploma pendurado atrás da bunda, que nem chapa de carro, e não com essas calças tão apertadas, só pra mostrar as formas a-bun-dan-tes. Ele gesticulava moldando as formas femininas com as mãos, acompanhando sua fala.
- A minha não é tão apertada...
- É sim, que eu olhei quando você foi ao banheiro. E olha que é um belo “derriére” esse emoldurado por sua calça “apertadíssima”.
- Descarado!!! Parece apertada porque tem lycra, mas não é!!! Disse desconcertada, com as mãos espalmadas sobre a bunda, mesmo sentada, tentando disfarçar o que o que já fora exposto. Ela sentia, com razão, o olhar curioso de todos ali, pairando sobre seus glúteos.
Ele ri alto, de forma irônica e bebe seu chopp, balançando a cabeça de forma negativa.
Eu, confesso, que como quase todo o bar, estava completamente absorto pela conversa alheia e nem lembrava mais de minha matéria. "Que maluco machista!!!” Pensei. ”Um porco nojento!!! E no primeiro encontro ainda...”
- E outra coisa...disse ela...Você me conheceu conversando pela net. Logo, me convidou pra sair pelas nossas conversas, pela minha inteligência!!! Isso com seus olhos já soltando faíscas.
- É verdade, ele responde, mas só depois de ver suas fotos de biquíni no Instagram!!! E dá uma sonora gargalhada.
Ela explode!!! Levanta derrubando a cadeira e se exalta:
- É por causa dessa desvalorização do cérebro, da inteligência das mulheres e de animais irracionais que nem você que a gente só vê desgraça acontecendo, feminicídio, estupro, gente sem controle, que acha que mulher é só um pedaço de carne... E quer saber, eu vou pra minha casa!!! E não vou dar pra você o prazer da companhia de meu cérebro e muito menos de minha bunda!!! Tchau, seu machista de merda!!!
Silêncio sepulcral no bar!!! Quase devolvo o chopp na caneca!!! Senti culpa, mas não pude deixar de observar seu sacolejar, enquanto ela saía raivosamente, estalando o salto alto de suas botas contra o piso de madeira. Eu e pelo menos toda a ala masculina do salão, inclusive o garçom, que balançava a cabeça, com os olhos arregalados.
Ele, o abandonado sem noção, continuou rindo, tomou o último gole de seu chopp, arrotou, e gritou:
- Garçom, traz mais um chopp, que o cérebro invejoso foi embora e levou aquela bunda maravilhosa com ele!!! Quem não tem pecado que atire a primeira pedra!!!

Um comentário:

  1. conversa vai conversa vem !!!! é termina sempre alguem falando de bundas , quem manda as brasileiras ter um bundão, no pais da bundalização .

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